Ele nasceu no ano de 1961, durante o governo de Mao Tsé Tung. Sexto filho de um total de sete.
A hora das refeições era sempre triste, conta ele. Porque sua mãe, muitas vezes, não tinha o que cozinhar.
Inhame seco era a base da alimentação pela maior parte do ano.
Ocasionalmente, havia pão de milho e farinha, artigos especiais e, por isso, guardados para oferecer a visitas importantes.
À hora das refeições, as sete crianças ficavam esperando que o pai começasse a comer.
Comiam inhames secos, cozidos na água ou no vapor, dia após dia, mês após mês, ano após ano.
Depois da primeira mordida do pai é que eles se serviam. Os pais comiam bem devagar, para que sobrasse mais comida para os filhos.
A mãe dizia aos filhos que deixassem a melhor porção para o pai, pois era ele quem garantia o sustento.
Mas o pai sempre arranjava desculpas e pedia que deixassem a melhor porção para a mãe.
Não fosse ela, enfatizava, nada teriam para comer senão “vento noroeste”.
Raramente comiam carne. Uma vez por mês, após enfrentar longas filas, podiam comprar um pedaço de porco gordo.
E Li Cunxin narra, em suas memórias, que numa tarde, sua mãe o mandou comprar carne no açougue da comuna onde moravam.
As filas eram enormes. Três filas. Ele esperou mais de uma hora e finalmente conseguiu comprar um pedaço pequeno de carne gorda de porco.
Saiu a correr e a saltar de felicidade por sua conquista.
Sua mãe cortou a carne em pedaços pequenos, igualmente feliz pela gordura que iria durar, com certeza, um bom tempo.
Naquela noite, quando foi servida a carne com acelga, todos podiam ver o óleo precioso flutuando no molho.
Um dos meninos encontrou um pedaço de carne de porco em sua porção.
Sem pestanejar, colocou no prato do pai. Este repassou imediatamente a carne para o prato da mãe.
Ela devolveu, dizendo:
Não seja tolo! Fiz a comida especialmente para você. Você precisa ficar forte para trabalhar!
Próximo ao pai, estava o filho mais novo. O pai olhou para ele, chamou-o pelo nome e disse:
Deixe-me ver os seus dentes.
Antes que alguém pudesse dizer alguma coisa, ele colocou o pedaço de carne de porco na boca do filho.
O silêncio que se seguiu foi quebrado apenas pelo longo suspiro da mãe.
Sempre era assim. Um raro pedacinho de carne em uma tigela de vegetais era passado de um para outro.
Os olhos famintos pediam mais. Mas nunca falavam. Todos sabiam que era difícil conseguir comida.
Não havia mais, simplesmente. E os pais não sabiam de onde viria a próxima refeição.
Assim era a vida naquela família, onde o pai trabalhava da madrugada ao entardecer, por miserável pagamento mensal.
Onde a mãe lavava, limpava, cozinhava, costurava e ainda ia trabalhar no campo, para conseguir um pouco mais de recursos.
* * *
Cuidado uns com os outros – é isso que o fato narrado nos ensina.
Será que em nosso lar estamos passando esses valores para nossos filhos: de se preocuparem com o irmão, conosco, seus pais?
Lendo a história da miséria vivida por Li Cunxin, podemos pensar que jamais seremos tão pobres, a ponto de disputar o alimento.
Não importa. O importante a ressaltar é que cultivemos o amor.
Esse amor que se demonstra em pequenos gestos, em preciosas doações.
Pode ser ofertar uma flor, um doce, um mimo. Pode, com doçura se resumir em fitar nos olhos o outro e perguntar:
Você está muito cansado? Como foi o seu dia? Que posso fazer para você se sentir melhor?
Pense nisso.
Redação do Momento Espírita com base no cap. 1 do livro Adeus, China
– o último bailarino de Mao, de Li Cunxin, ed. Fundamento.
Em 02.06.2008.